Casa de infância
Acabamos sempre por regressar. Por mais longe que estejamos, por muito tempo que nos afastemos, a casa que nos viu crescer será sempre nossa.
A porta que varre o chão com um sussurro suave transporta-nos para o passado - mesmo que entremos carregados de presente! Com todo um presente permanente, ruidoso, cheio de vida e a dar os seus passinhos irregulares. "Foi aqui que a mamã cresceu, bebé" - digo-lhe, apesar dos seus modos ensonados.
Quase que consigo imaginar a minha mãe a chamar-nos para o jantar do hall de entrada. Nessa altura, estaria provavelmente deitada na cama, a ouvir as minhas músicas tristes da adolescência, contemplando o meu céu particular de estrelas coladas no tecto. Fixava, certamente, aquela estrela que considerava especial.
Depois de sentada à mesa, esperavamos ouvir, minutos mais tarde, o ranger da porta do escritório e o meu pai a subir as escadas.
Tive uma infância feliz e esta casa é testemunha disso. As paredes e os objectos, aqui, têm alma e memória.
"Sim, bebé, esta era a minha casa. Os pássaros que ouves talvez ainda sejam os mesmos".
Tudo aqui é calma e contemplação, vejo-o apenas agora. O tempo escorre lento, não corre como na cidade.
"Também tu, bebé, terás um dia uma casa a que voltar. Ao chegar, também irás pousar as malas e inspirar profundamente, encher esses teus pulmões vitoriosos e sorrir por estar de volta".
Regressamos, sempre, onde fomos felizes.