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The Middle Way

The Middle Way

28 de Dezembro, 2017

A Salsa mimada

JR

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Chegou a casa em meados do Verão de 2013. Pequenina. Pêlos eriçados. Orelha direita pendente.

Medrosa, escondendo-se em todos os recantos. Olhos redondos e escuros, lacrimejantes.

 

Aos poucos, foi-se aproximando. Pata-ante-pata, passos curtos hesitantes. Narizinho posto no ar, sorvendo os cheiros, ainda estranhos.

Chorou toda a primeira noite. Mas apenas essa.

 

Depois, conquistou o espaço. A caminha, o azulejo da cozinha e a madeira da sala. Fez dos seus brinquedos amigos, correndo com o seu porquinho laranja por toda a casa. Uma bola de pêlo rebolando no soalho. Passou a dormir tranquila. Começou a levantar a orelhita.

 

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A Salsa preencheu a nossa pequena família. Deu-lhe vida e energia mas, ao mesmo tempo, paz e carinho nos momentos cansados. Minúsculos abraços felpudos.

 

Por isso mesmo, quando comecei a pensar em fazer actividades em família, a Salsa fez sempre parte da equação. A chegada da bebé roubou-lhe um pouco do protagonismo, mas não do amor. Chegará o dia em que ela vai perceber que as novas aquisições da família significam um multiplicar de carinho.

 

Este Natal, a Salsa teve direito a biscoitos caseiros feitos por mim e pela bebé: chicletes de banana biscoitos de abóbora e batata doce.

A inspiração veio daquidaqui.

 

Ela adorou! Principalmente os biscoitos de abóbora, devorando-os electricamente.

 

Chicletes de banana:

- duas bananas maduras;

 

Cortar as bananas em tiras longitudinais fininhas e dispô-las num tabuleiro forrado a papel vegetal. Levar ao forno a 100ºC durante 1h30-2h até desidratarem, mas sem as deixar ficar crocantes. 

Ficam com uma certa consistência elástica, sendo mais difíceis de roer.

 

Biscoitos de abóbora e batata doce:

 

Ingredientes:

- 200g de farinha de arroz

- pequena pitada de canela

- 220g de puré de batata doce

- 100g de puré de abóbora

- 110 mL de água

- 1 ovo

 

Pré-aquecer o forno a 180ºC.

Numa taça grande, misturar a pitada de canela à farinha de arroz.

Num recipiente à parte, juntar o puré de batata e o puré de abóbora ao ovo é àgua e misturar bem.

Lentamente, juntar o preparado húmido à farinha e bater até formar uma massa consistente.

Num tabuleiro forrado a papel vegetal ir dispondo, com cerca de 1 cm de intervalo, pequenas bolas moldadas do preparado obtido anteriormente. Pode-se decorar a bola com um garfo para lhe dar uma aparência mais divertida.

Levar ao forno durante 20 minutos.

Deixar arrefecer antes de dar ao seu amigo patudo. Dessa forma vão-se tornar mais crocantes.

 

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Não menos importante, têm a vantagem de não ter embalagem!

Devem ser consumidos rapidamente. Caso contrário, o melhor é congelar uma parte para dar mais tarde. Deixei estragar alguns dos meus...

 

Que miminhos dão aos vossos animais?

 

 

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19 de Dezembro, 2017

A viagem - uma história #3

JR

Setembro de 2012

 

III

 

Acordei para uma manhã solarenga. Abri as cortinas para deixar entrar a pálida luz e deixei-me dormitar um pouco mais. O hotel pareceu-me estranhamente vazio, com poucos carros no parque de estacionamento. Demorei até encontrar a sala do pequeno-almoço. Depois de uma sandes de queijo e de um café revigorante, lá arranquei rumo ao Alto Alentejo. Ao longo destes três dias, tenho-me apercebido de que uma boa banda sonora no carro influencia bastante o nosso estado de espírito. Com isso em mente e com uma boa dose de energia, deixei tocar bem alto os hits da minha adolescência, na voz de Fred Durst - e na minha. E assim, gritando raivas acumuladas pela janela do carro, cheguei a Vila Viçosa.

 

Por sorte, estamos no último dia das festas dos Capuchos. A praça principal da terra estava cheia de pessoas andando, de um lado para o outro, de cerveja na mão. Outras encostavam-se a um estrado de madeira que delimitava uma espécie de recinto que tinha, como ponto central, uma fonte de pedra. Foi então que ouvi um estrondo! Com curiosidade, furei a multidão e, também eu, espreitei através das grades. Dei de caras com um touro grande, preto e pachorrento. Aparentemente, era o touro 36, segundo a inscrição que trazia no dorso. "Ah! Este mexe-se mais que o de ontem! Pelo menos, já corre pelo recinto todo. O de ontem ficou-se ali por cima" - disse-me, apontando, uma senhora de chapéu na cabeça que se aproximou de mim. "Lançam um touro por dia?" - perguntei. "Não, não! São três. Hoje ainda tem mais dois para ver". 

Olhei para o touro e achei-o tudo menos energético. Olhava confuso para todas as pessoas que o incitavam e, de vez em quando, lá investia. Os corajosos forcados amadores, nas suas camisas brancas e óculos Ray Ban, corriam desalmadamente para o ponto elevado mais próximo. Decidi deixar a multidão animada a cansar o pobre bicho e fui ver o castelo.

Como calculei, estava vazio. Entrei na igreja, sentei-me um pouco ao fresco, voltei a sair e decidi entrar no cemitério. Logo à entrada, a campa de Florbela Espanca! Ah! Como eu devorava os poemas dela! Li-os muitas vezes, nas alturas tristes, partilhando a mágoa e solidão que ela tanto descrevia.

Regressei, depois de um passeio rápido pela vila, para a zona animada da festa dos Capuchos. O mesmo touro, o tal 36, lá andava de um lado para o outro, babando-se de cansaço. Olhos desnorteados, narinas abertas da respiração ofegante, tentando decidir qual dos corajosos merecia mais um pouco do seu esforço. Com tamanha indecisão, achei que era altura de ir almoçar uns pézinhos de coentrada, antes de rumar a Borba.

 

O caminho entre Vila Viçosa e Borba está cheio de pedreiras de mármore. Pedras brancas gigantes, amontoadas, como se tivesse havido, na noite anterior, uma chuvada de pedras. Lá mais para a frente, como estava à espera, as vinhas. Estas mantêm-se durante o resto do caminho e multiplicam-se até Elvas.

O centro histórico de Elvas está dentro de grandes muralhas protegidas, ainda, por um fosso fundo. À volta da cidade, existem mais dois fortes, o forte da Graça e o de Santa Luzia, que nos propiciam uma vista magnífica do alto do Castelo. Pela primeira vez, fiquei a dormir em casa de amigos. Lá consegui exercitar a minha voz. As conversas desenrolaram-se, cada vez mais fluidas, durante um óptimo jantar alentejano de migas de espargos e hortelã, regado com um bom vinho regional alentejano recomendado pelo empregado de mesa, que era brasileiro. Encontrava-me entre um engenheiro e uma médica. 

O dia acabou com uma volta nocturna pela cidade velha. Assim, à noite, a cidade ganhou um encanto especial. E foi aqui, em Elvas, que pela primeira vez senti falta de ter alguém comigo, ao meu lado, nesta viagem. As muralhas iluminadas, no meio da ventania forte que se fazia sentir naquela noite estrelada, merecia um abraço, com Badajoz no horizonte.

 

 

Fechei a porta atrás de ti.

 

Quando entraste, naquela noite, sabia que tudo tinha um jeito de despedida. Trouxeste tu a garrafa de vinho e eu não fiz jantar. Sentia um nervosismo resignado, bem diferente do nervosismo expectante das outras vezes. Sempre me deixaste nervosa, como quem não sabe onde pôr a mão, como colocar a voz, qual a palavra certa.

Conhecia-te de histórias, de longas e míticas histórias dos teus tempos de rebeldia e, a princípio, foi difícil associar-te, a ti fisicamente, à personagem que tinha criado no meu imaginário. Mas, foste marcando presença no meu dia-a-dia e eu deixei. Falar contigo começou a ser fácil. Sempre fui uma pessoa mais de palavras escritas do que faladas, mas tu fazias questão de me ouvir e de te fazeres ouvir. E eu ouvi, ouvi sempre. Já não tinha como fugir, como estar longe de ti. Foi tudo tão rápido, parecia tudo tão magnificamente irreal, mas forte e intenso e perigoso. 

Foi assim que eu vivi a nossa história.

 

***

 

Portanto, fechei a porta atrás de ti, depois do beijo e do abraço, e chorei. Fiquei encostada à porta a tentar ganhar coragem para chamar por ti pela janela, ou à espera que tu fizesses o mesmo. Mas deixei passar os minutos e secar as lágrimas. Foste-te embora e eu fiquei, irremediavelmente, à tua espera.

 

Durante a tua ausência, revivi os momentos que tínhamos passado juntos, as conversas, as tuas expressões por detrás das palavras. A cidade rendeu-se ao frio de Dezembro e eu coloquei a minha pequena árvore de Natal ao pé da janela. Luzes coloridas na escuridão propositada da casa. Nessa escuridão, enchia o copo de vidro vermelho com vinho e olhava, sem ver, a rua de calçada portuguesa através da janela. Pensei em ti, desmedidamente. Via-nos, ainda, no sofá desconfortável da sala, nas longas noites de conversa que partilhávamos. Quando agora penso em ti, lembro-me do frio das ruas, do aconchego de estar em casa, dos pés molhados da chuva. Lembro-me dos telhados das casas e do rio ao fundo, do céu estrelado do Alentejo. Lembro-me do pulso acelerado, dos papéis escritos, das memórias que guardei para depois partilhar contigo. Lembro-me do tempo que nunca mais passava, principalmente, desse tempo que nunca mais passava.

Foste o meu Verão e o meu Inverno.

 

***

 

Acho que nunca te apercebeste do quanto de mim levaste contigo na viagem. Voltaste incompleto e não te voltei a abrir a porta. Quando dei por mim, estava sozinha com as mãos cheias de um amor que guardei, inútil e estúpido. A porta fechada. A árvore de Natal guardada na caixa, o início da Primavera lá fora. O tempo que tinha, afinal, passado e o sofá vazio. O Alentejo lá longe.

 

 

 

...to be continued.

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13 de Dezembro, 2017

Bolo de gengibre e uma Dracaena

JR

A semana começou com a casa a cheirar a Natal.

 

Os dias que, apesar de solarengos, têm estado frios pedem calor e aconchego. Sabe bem chegar a casa e vestir roupas quentinhas. Sabem bem bebidas quentes bebidas sem pressa, abraços apertados embrulhados em mantas no sofá. O acto de cozinhar, principalmente quando partilhado, gera calor. O forno ligado, o cheiro quente a especiarias. A azáfama na cozinha. 

 

Os bolos e bolachas de gengibre e especiarias são a prova inquestionável de que o Natal se está a aproximar. A partir do momento que o aroma delicioso se alastra por todas as divisões, instala-se uma vontade clara de ligar o rádio e dançar ao som de Christmas carols. 

 

Foi assim cá por casa.

 

E o bolo foi este.

 

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Bolo de Gengibre e Especiarias (receita original aqui)

 

Ingredientes

 

Para o bolo:

- 200g de farinha com fermento

- 2 colheres de chá de canela em pó

- 1 colher de chá de cravinho em pó

- 2 colheres de sopa de gengibre fresco ralado

- 1 colher de chá de bicarbonato de sódio

- 100g de manteiga derretida

- 120g de açúcar moreno

- 100g de puré de maçã 

 

Para a cobertura:

- 3 colheres de sopa de manteiga

- 300g de açúcar em pó

- 60g de queijo creme

- 1/2 colher de chá de aroma de baunilha

- 5 colheres de sopa de leite

 

Pré-aquecer o forno a 180ºC e untar uma forma.

Numa taça média, misturar a farinha, a canela, o cravinho, o gengibre e o bicarbonato de sódio até terem uma distribuição homogénea.

Numa taça grande, bater bem a manteiga, o açúcar e o puré de maçã.

Juntar, lentamente, os ingredientes secos aos ingredientes húmidos e bater bem até obter uma massa cremosa.

Verter o conteúdo na forma e levar ao forno durante cerca de 40-45 min. ou até passar no teste do palito.

Retirar do forno e deixar arrefecer.

 

Entretanto, numa taça média, batem-se todos os ingredientes da cobertura até se obter um preparado sedoso que deve ser vertido sobre o bolo já arrefecido. 

 

Muuuuito bom!

 

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Aproveito, também, para vos apresentar a nova habitante desta casa!

 

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A nossa Dracaena!

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11 de Dezembro, 2017

Laranja e chocolate

JR

Acho que nunca tinha mergulhado assim no Natal.

Ele não existe, apenas. É criado por mim, por nós, pela nossa família. Dia após dia.

Como qualquer outra história, vai ganhando forma e conteúdo. As cores e os cheiros intensificam-se. A casa fica cada vez mais aconchegante.

 

A pequenina vai familiarizando-se com o Natal. Parece que se vão dar bem.

 

Os últimos dias foram bastante activos, graças ao nosso divertido calendário do advento. Não só fomos conhecer a Vila Natal de Óbidos, mágica para as crianças, como também tivemos a oportunidade de decorar a nossa casa com laranjas, cozinhar um delicioso bolo de gengibre e adoptar uma planta nova. Enquanto escrevo estas linhas, saboreio um incível chocolate quente, tão bom quanto calórico. 

...mas é Natal e merecemos.

 

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Laranjas desidratadas

 

Decidimos desidratar laranjas e utilizá-las na decoração da nossa casa. Ficaram lindas! O processo é fácil, mas demora tempo.

 

Ingredientes:

- duas laranjas médias

- açúcar em pó qb

 

Basta cortar as laranjas às fatias, o mais fino possível, tentando manter a sua forma circular intacta. Posteriormente, secam-se as fatias em panos de cozinha.

Polvilham-se ambos os lados das fatias de laranja com açúcar em pó e, de seguida, distribuem-se as mesmas num tabuleiro de ir ao forno forrado a papel vegetal.

Vão ao forno a uma temperatura de 100ºC, durante 3 horas. De tempos a tempos, devem-se virar as fatias, de modo a obter uma desidratação uniforme.

Depois...é só dar asas à imaginação!

 

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Chocolate quente mega calórico (mas incrível):

 

Acreditem, vale a pena experimentar! Principalmente no Natal. 

Vá...talvez, também, na Páscoa. 

 

Ingredientes:

- 200mL de leite meio gordo

- 120g de chocolate negro (mínimo 70% de cacau) cortado em pequenos pedaços

- 100g de natas

- açúcar a gosto (opcional)

- 1/2 colher de chá de café solúvel

 

Numa panela pequena, aquece-se em lume médio o leite, as natas, o açúcar e o café. Retira-se do calor pouco antes de levantar fervura (quando começam a formar-se umas pequenas bolhinhas na periferia). Nessa altura, adiciona-se o chocolate em pedaços e vai-se mexendo até que fique todo dissolvido. 

Se pretenderem uma consistência mais espessa, basta adicionar mais chocolate.

 

Aquece o corpo e a alma.

 

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Prometo, em breve, apresentar-vos a nova inquilina desta casa. E, também, partilhar a receita do nosso bolo de gengibre, que tem sido um sucesso.

 

Até lá, que tenham dias felizes!

 

 

 

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06 de Dezembro, 2017

A viagem - uma história #2

JR

Setembro de 2012

 

II

 

O dia começou enevoado pela manhã cedo. Por momentos, pensei que fosse chover. Mas, acho que foi essa cor cinzenta e lânguida que acabou por dar mais encanto à pacata metrópole alentejana de Beja. A cidade calcorreia-se rápido. Tem um pequeno centro histórico, com ruelas e casas coloridas, como bom lugarejo alentejano.

Os meus passos foram, entretanto, interrompidos por vozes exaltadas e frias vindas de uma janela azul de um palácio antigo. Ouvi-as, primeiro sem atenção. "Esteja calado!" - seguiu-se a voz rouca e pouco firme de um senhor de idade - "Seu chato!" - novamente o senhor, tentando impôr o seu ponto de vista - "Olhe que há gente que não tem quem cuide deles!" - som de pratos e talheres. Uma senhora a chorar ao longe. Parei. Foi aí que passei os meus olhos pelo edifício. Poderia aquilo ser um lar de idosos? Acelerei o meu passo, outrora lento de passeio, voltei atrás e fui procurar a porta principal: Centro de Apoio à Terceira Idade.

Apoio? Apoio de palavras? De carinho?

 

Decidi fazer-me, novamente, à estrada, no preciso momento que o sol voltou a vislumbrar-se por entre as nuvens. É engraçado como, realmente, a paisagem vai mudando ao longo do caminho. A cor avermelhada foi sendo substituída por um amarelo claro, largo no espaço, em longos campos de trigo, aqui e ali, manchados pelo castanho de girassóis secos e vergados. Tristes.

Cuba é capaz de ser dos sítios mais sós do Alentejo. Poucas foram as pessoas que se cruzaram comigo na rua. O senhor de boina e bengala a quem pedi indicações sobre um bom restaurante fez-me ver, na pacatez do seu discurso, que hoje era domingo. Agradeci, saudei Cristóvão Colombo no seu pedestal no centro da praça e perdi-me nas ruelas. Contentei-me com um belo hot dog, pouco típico da região.

 

Cheguei à barragem do Alqueva ainda com o sabor a ketchup americano. A paisagem é indescritível! Torna-se mais acidentada, com montes que se elevam, mais pontilhados de verde. O azul forte e brilhante da água é interrompido, ocasionalmente, por pequenos ilhéus. Teria ficado horas, alegremente, sentada no topo daquele miradouro. Lembrei-me do livro dentro da mochila, na mala do carro, lá em baixo, e arrependi-me de não o ter posto na carteira que levava ao ombro. Este sim, o "admirável mundo novo!" que vim descobrir. 

A barragem do Alqueva tem uma extensão enorme vista da aldeia histórica de Monsaraz. Do topo do seu castelo, temos uma vista panorâmica privilegiada da região. Monsaraz estava apinhado de gente! Logo à entrada, um trânsito a que já não estava habituada, com autocarros e turistas de bonés enfiados na cabeça. O omnipresente casal japonês, turistas obrigatórios em qualquer parte do mundo, de máquina fotográfica ao pescoço e sorriso aberto para o universo. Desta vez, o pôr-do-sol começou em frente à Rocha dos Namorados, que encontrei no caminho de regresso. Segui as indicações do cartaz informativo colocado lá perto: "...ainda hoje, as mulheres solteiras atiram uma pedra com a mão esquerda, de costas para a rocha, tentando colocá-la no seu topo. O número de tentativas falhadas corresponderá ao número de anos que faltam até se casarem." Uma, duas...três! Terceira pedra no cimo da rocha! Dois anos e estou casada! Ri-me com a improbabilidade de tal acontecer.

 

A entrada de Reguengos de Monsaraz cheira a vinho. Tal já se podia adivinhar, ao longo do caminho, pela quantidade de vinhas que ladeiam a estrada. Uns poucos dias mais e começam as vindimas. Arrepiei-me com a percepção inesperada do passar do tempo. 

E foi com o sabor quente do bom vinho tinto de Monsaraz que acabei o dia. Dentro deste quarto, ouvem-se os grilos lá fora. Da varanda, se fechasse os olhos, sentia-me em casa.

 

 

Era bem pequena quando fui para terras orientais. Na altura, ainda sob governação portuguesa, Macau podia ter sido considerada mais uma viagem na minha terra. As minhas memórias remotas, dos primeiros meses em Macau, são escassas. Lembro-me de todas aquelas coisas que marcam as crianças: os passeios em família, a estranheza da comida, os brinquedos que os meus pais foram comprando para alegrar o quarto de hotel, que foi a nossa primeira casa. Recordo as saudades, saudades da família e do meu amigo Álvaro, senhor bem parecido, de cabelos brancos raros espalhados na sua careca. O Álvaro foi o meu primeiro e melhor amigo de infância. Andava comigo para todo o lado, nos seus ombros ou atrás da sua bicicleta. Muitos dos meus dias eram passados na casa dele e da Maria ora vendo televisão, ora jogando Lotto. Aquela casa e aquele abraço eram o meu ponto de refúgio onde estava sempre, indiscutivelmente, protegida.

A Maria tratava da logística toda, rápida e desenvolta, dando-me óptimas sandes de chouriço. Adorava chouriço e ela fazia questão de ter sempre essa iguaria à minha espera. O Álvaro estragava-me com mimos. Lembro-me, perfeitamente, do pequeno copinho de vidro em forma de bota, onde ele me dava a provar umas gotinhas de café. A Maria bem reclamava - "não dês café à menina!...". Mas eu gostava e ele fazia-me, sempre, a vontade. Talvez o meu desmedido gosto por café, principalmente pelo seu aroma logo pela manhã, venha desses tempos passados.

Portanto, quando fui para Macau, o Álvaro ficou a chorar. Nunca me esqueci disso e, até me adaptar áquela terra estranha, andei triste também. Por ele.

 

Mas Macau ficou. As ruas começaram a fazer parte do meu dia-a-dia, os cheiros entranharam-se em mim, os sabores de todas as iguarias que comprava, sem medo, aos vendedores de rua tornaram-se vício. Todo aquele reboliço das ruas sujas, fervilhando de gente, de carros, de riquexós, de néons iluminados...tornou-se casa. Cresci numa mistura de línguas. O português, o inglês e o cantonense. Tornei-me, eu mesma, um pouco chinesa também.

Viajar de avião era já habitual. As longas horas no ar, bem lá no alto, não me incomodavam. Tinha sempre espaço no chão, entre as fileiras de cadeiras, onde cabia na perfeição. Lembro-me de adormecer, feliz, ao som ruidoso dos motores a trabalhar. Acordava ansiosa por saber que iguaria ia ser servida ao almoço e ao jantar. Toda a agitação prévia à viagem, fazer as malas, me deixava encantada na antecipação do ir.

 

Ainda hoje consigo traçar, mentalmente, grande parte dos percursos que fazia. Estranhamente, dou por mim a desejar sentir aquele ar pesado de humidade, quase irrespirável! Imagino-me sentada nos areais da praia de Hác-sá, com os pés enterrados e sujos de areia preta. Retorno, vezes sem conta, a esta infância longínqua.

 

A nossa casa está onde nos sentimos felizes.

 

 

 

...to be continued.

 

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05 de Dezembro, 2017

Plasticina de Maizena e outras ideias giras para os miúdos

JR

Dias de ida ao hospital são sempre mais atribulados. Por isso, hoje, tivemos de adiar a atividade do nosso calendário do Advento. Desta forma, amanhã vamos cumprir não uma, mas duas actividades! 

 

Tem sido uma experiência maravilhosa! Por um lado, quero que a bebé comece a ver toda esta azáfama boa como rotina de Natal. Quanto a mim, tenho descoberto alguns dotes escondidos e, confesso, tem-me dado prazer criar coisas de raíz, com as minhas próprias mãos. Acima de tudo, temo-nos divertido imenso!

 

Há uns dias atrás fizemos neve de moldar (uma espécie de plasticina). Faz-se, literalmente, em menos de 5 minutos com ingredientes que quase toda a gente tem em casa (ou fáceis de adquirir).

 

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Como fazer?

 

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- Basta misturar partes iguais de amido de mido (farinha Maizena) e loção corporal! Done! Para ficar a parecer neve, convém usar um creme de corpo de cor branca. Nós juntamos, ainda, uns brilhantes comestíveis que eu tinha cá em casa e umas gotinhas de óleo essencial de pinho para lhe dar um toque mais florestal. 

Quando se começa a misturar os ingredientes com a mão, o preparado é, inicialmente, um pouco pegajoso, colando-se aos dedos. Mas, quando bem misturado, parece plasticina! 

Tanto dá para esfarelar como moldar! - Tal e qual a neve! (principalmente após guardar a plasticina no frigorífico umas horas...)

Tem, ainda, a vantagem de deixar as mãos extremamente hidratadas. 

 

Para acompanhar esta tarefa, fizemos uns chips de couve Kale. Crocantes! 

 

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Basta ripar as folhas da couve e dispô-las num tabuleiro, regar com azeite e temperar com sal e pimenta. Vão ao forno pré-aquecido a 150ºC durante uns 5 minutos. 

Fácil. Muito Fácil!

 

Por fim, a manhã de ontem foi passada na apanha da pinha! 

Exactamente...o objectivo era ir apanhar pinhas, folhas, ramos...enfim, o que nos chamasse à atenção, para, depois, decorarmos a nossa casa de forma natural e sem desperdício. Fomos, alegremente, brindadas com um dia lindo de sol.

Eis o resultado...

 

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E por aí? O que andam a fazer com as vossas crianças? (Ou com as crianças que há em vocês...?) 

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02 de Dezembro, 2017

Os dois primeiros dias do Advento

JR

Num dos últimos posts partilhei algumas ideias para um Natal mais sustentável. Ideias que me foram surgindo, a mim mesma, quando pensei sobre o assunto. Uma delas era sobre um calendário do Advento com actividades familiares em vez de chocolates ou prendinhas. Isto, no último ano, tornou-se extremamente importante para mim, com o nascimento da nossa pequenina. Estarmos todos juntos.

 

E, portanto, Dezembro já começou! Infelizmente, a montagem da árvore de Natal teve de ser adiada uma vez que o papá tem estado fora. De qualquer forma, eu e a bebé temos cumprido o ritual e as tarefas!

 

No primeiro dia, tínhamos de criar um presépio com materiais que tivessemos cá por casa. Depois de retirar algumas ideias online metemos mãos à obra! Utilizamos rolhas de cortiça, restos de tecido, botões velhos, um colar de madeira estragado, um pauzinho de madeira que apanhamos no parque e um pedaço de algodão que ainda tinha perdido cá por casa. A base do presépio é uma base de copos (que depois vai voltar para a sua função original). A pequena H. adorou espalhar tudo pelo chão! 

E é com orgulho que vos apresento...

 

...o nosso presépio!

 

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No segundo dia tinhamos como tarefa montar a prenda da Salsa, a nossa chihuahua. Todos os anos ofereço uma nova caminha à Salsinha. Isto porque ela acha que a cama é um óptimo objecto para roer ou para "escavar". Ano após ano, temos sempre uma cama em ruínas. Este não foi excepção. Mas, em vez de comprar uma cama igual a todas as outras, decidi comprar um cesto de verga resistente, uma boa mantinha e, depois, utilizar uma almofada velha que aqui tenho e uma fronha tingida. O resultado, esteticamente, foi muuuuito melhor que qualquer uma das caminhas que lhe tenho comprado até agora. E ela adorou!

No futuro, é só ir mudando as almofadas por almofadas nossas que vão ficando velhas. Acredito que o cesto de verga se vá aguentar! É, também, muito mais fácil de limpar.

 

E a Salsa ficou feliz!

 

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E, para aquecer as noites que vão ficando gélidas, tenho feito um latte de camomila e alfazema. Delicioso!

 

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Num fervedor, deita-se a quantidade de leite pretendida (leite de vaca ou vegetal) e um bocado de camomila seca e alfazema (a gosto). Deixa-se aquecer bem, mas sem deixar ferver.

Coa-se o preparado para uma caneca e podem adoçar com uma colher de mel. 

 

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Que venham os próximos dias e as próximas actividades!

I am ready!

 

 

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01 de Dezembro, 2017

A viagem - uma história #1

JR

Setembro de 2012

 

I

 

 As viagens começam no momento que decidimos fazê-las. Esta, que agora faço, começou numa bela tarde de Verão, em Lisboa. Descia eu, na altura, a longa Avenida da Liberdade, procurando a sombra das árvores para tentar suportar o calor. Ia em silêncio porque ia sozinha. E estava feliz. Não foi assim há muito tempo que comecei a gostar de estar sozinha mas, a partir do momento que fiz as pazes comigo mesma, o meu espaço ganhou aconchego. Talvez tenha sido a alegria pachorrenta desse dia quente, talvez o próprio nome da avenida, que me fez tomar esta decisão: vou conhecer, sozinha, o meu país. E, ali mesmo, começou a viagem...

 

...que me trouxe até este quarto de hotel, em Beja. Primeiro dia, primeiros quilómetros. Acordei cedo, sem aquele sono típico de quem desperta para mais um dia de trabalho. Bebi o café, mais por hábito do que por necessidade, atirei a mochila para o carro e sorri para o volante. "Aqui vou eu!". E, assim, galguei sem pressas a Serra do Caldeirão. Janelas abertas, mão fora do vidro rindo-me, ocasionalmente, com o nome de terriolas perdidas nas encostas, no meio da pouca vegetação que sobreviveu aos já habituais incêndios de verão. 

 

A chegada a Mértola é, simplesmente, deslumbrante! O castelo lá no topo, bem no topo daquele escarpado, acessível por uma ponte estreita. As casas brancas nas ruas velhas, coloridas aqui e ali por flores nos beirais e roupas estendidas ao sol tórrido. O Guadiana lá em baixo, lento. E toda aquela solidão das ruas vazias de pessoas. Por estes lados, as terras são sonolentas.

 

Depois de um mergulho inesperado numa praia fluvial, cheguei às antigas Minas de São Domingos. Entrar naquele complexo mineiro é como dar um passo para uma outra época. O sítio é amplo, largo, de terra castanha e vermelha, fervente sob o sol da uma da tarde, engolindo aqueles destroços gigantes, de oficinas enormes, canos enferrujados e pedras que tombaram no caminho. O cheiro a metal, enxofre...e um lago parado de cor amarela, rodeado de pedra corroída, pontiaguda, atrás de um letreiro que avisa: "águas contaminadas". E o silêncio pesado de vozes que se calaram no tempo. Parece que estamos a testemunhar o assassinato de toda uma povoação e de toda uma história e se, naquele momento, tivesse ouvido um grito rasgar o vento não me surpreenderia. A verdade é que, aquele sítio, é agradavelmente assustador.

E segui caminho até Beja. Na calmaria, de tempo e de espírito, aumentei o som do rádio ao máximo e partilhei o pôr-do-sol com o Bob Dylan.

 

Éramos tão novos! Na altura, claro, não nos apercebemos disso. Começou inesperadamente. Lembro-me, como se fosse hoje, da piscina iluminada e do "adoro-te" que tinhas escrito no papel colado na parede da casa. Tinhas feito anos. Guardei a foto que tiramos nessa noite durante anos! Agora que penso nisso, não era uma foto propriamente bonita: eu de cabeça colada à tua sweatshirt azul escura, tu bem mais alto que eu, de queixo quase pousado no meu cabelo e de olhos fechados. Mas aquela foto permaneceu e alongou-se nos meus dedos durante seis anos. Tal como o abraço.

 

No alto dos meus quinze anos, tinha medo. Tinha medo de duas coisas: que ficassemos juntos para sempre e de te perder. Naquela altura, tinha o incómodo desejo de querer sempre mais do mundo e da vida.

 

Nunca duvidei que nos amássemos. Na realidade, ao longo dos anos, foi isso que nos uniu sempre. Isso e a inesgotável cumplicidade que criamos. Cresci contigo, crescemos juntos. A determinada altura, era impossível existir sem ti, o meu mundo era o teu. Erro, após erro, após erro. É como digo, éramos novos. Eu era nova.

 

Sabia, exactamente, como tu eras. Fechava os olhos e via-te, como se realmente te estivesse a ver, lado a lado antes de dormirmos. Durante anos conseguia descrever-te mentalmente, em jeito de matar saudades. Guardei, na mão fechada, o sentir-te.

E passaram-se, num ápice que agora me pesa, dez anos. Dez anos! O tempo fez-nos crescer em sentidos opostos. Nunca largamos os ressentimentos, por muitos que foram. A primeira vez que me vi, definitivamente, sem ti foi um total reaprender a viver. Lá dizem os antigos que, nessas alturas, nos apercebemos o quanto de outra pessoa trazemos em nós. Em pequenas coisas senti, imensamente, a tua falta. A vontade de partilhar pensamentos banais contigo queimava-me a voz e a saudade do teu abraço de braços grandes esmagava-me o corpo. O facto é que nos obrigamos a viver com tudo isso e nos habituamos a uma certa forma de dor. O tempo empurra-nos, por mais que nos agarremos às paredes.

 

Ter-te e ter-te perdido foi, atrozmente, importante para mim. Hoje, lembro-te, como quem faz luto de um amor que perdura em dois adolescentes que morreram.

 

 

 

to be continued...

 

 

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